Por Renata Bueno*
Antonio Tajani, Ministro dos Negócios Estrangeiros e Vice-Primeiro Ministro do Governo da Itália, propôs recentemente uma reforma da cidadania denominada “jus Italiae”, que visa redefinir os métodos de aquisição da cidadania italiana. A reforma foi apresentada pelo partido Forza Italia (FI), liderado por Tajani, como uma adaptação às transformações sociais dos últimos anos e suscitou diversas polemicas no seio da coligação de centro-direita.
A recente proposta de reforma das leis de cidadania italiana gerou intensos debates, especialmente entre as comunidades de descendentes italianos ao redor do mundo. Batizada de “jus Italiae”, a reforma visa atualizar as regras para a concessão da cidadania italiana, refletindo as mudanças sociais e migratórias que o país tem enfrentado nas últimas décadas. No entanto, ao tentar limitar o direito ao jus sanguinis (cidadania por descendência), a proposta expressa preocupações profundas sobre a manutenção dos laços históricos e culturais entre a Itália e a sua diáspora.
A proposta de Tajani busca introduzir novos critérios para a concessão da cidadania italiana. Entre os pontos centrais está a criação do “jus Italiae”, que permite a concessão da cidadania a menores estrangeiros nascidos na Itália ou que chegaram ao país antes dos cinco anos de idade, desde que tenham residência ininterruptamente por, pelo menos, uma década e concluído com sucesso o ciclo escolar obrigatório. Embora esta iniciativa pareça inclusiva à primeira vista, ela impõe condições rigorosas, como o período de residência contínua, que pode acabar excluindo muitos cidadãos potenciais que poderiam contribuir significativamente para a sociedade italiana.
Por outro lado, a parte mais polêmica da proposta está relacionada às limitações do jus sanguinis. A nova regra restringe o direito à cidadania por descendência apenas até os bisavós, o que rompe com o princípio de que, por gerações, permitiu que milhões de descendentes de italianos no exterior mantivessem sua conexão com a Itália. Atualmente, o jus sanguinis permite que a cidadania seja transmitida indefinidamente, independentemente da distância geográfica ou do tempo. Essa mudança ameaça cortar um vínculo que não é apenas jurídico, mas também profundamente cultural e histórico.
Tajani defendeu a reforma como uma resposta às fraudes burocráticas relacionadas à concessão de garantias italianas através do jus sanguinis, além de destacar a necessidade de garantir que a cidadania reflita um desejo real de ser italiano, baseado em uma partilha de valores culturais e linguísticos.
Contudo, essa justificativa, embora válida em termos de controle de abusos, ignora a importância da diáspora italiana na preservação e fortalecimento da identidade italiana global.
Os descendentes de italianos ao redor do mundo desempenham um papel vital no fortalecimento das relações culturais, econômicas e sociais entre a Itália e os países em que residem. Nas Américas, por exemplo, os ítalo-descendentes contribuíram significativamente para o intercâmbio comercial, o turismo, os investimentos e a disseminação da cultura italiana. Ao limitar o jus sanguinis, a Itália corre o risco de alienar uma vasta comunidade que, por gerações, tem mantido viva a herança e os valores do país.
Essa reforma suscita uma reflexão maior: o que significa ser italiano? Para muitos, a cidadania italiana não é apenas um documento, mas uma manifestação de pertencimento. Ao enfraquecer o direito à cidadania por descendência, a identidade da Itália, construída ao longo de séculos de emigração e conexões transnacionais, pode estar se enfraquecendo. O que está em jogo não é apenas o direito a um aporte, mas a preservação de uma herança compartilhada que transcende fronteiras.
Em vez de criar barreiras, a Itália deveria considerar formas de estreitar ainda mais seus laços com sua diáspora, confirmando sua importância histórica e cultural. A reforma da cidadania precisa equilibrar as necessidades de controle migratório com a valorização da contribuição única dos descendentes italianos ao redor do mundo, garantindo que eles continuem a se sentir parte integrante da nação italiana. Afinal, a identidade italiana é, e sempre foi, global.
